Os
projetistas de fundações dispõem hoje de sistemas
e equipamentos específicos para cada tipo de solo e situação
de terreno. A evolução tecnológica do segmento
chegou ao ponto de permitir a alteração das características
do solo, feita por injeções CCP (cement churning pile
ou coluna de cimento com agitação violenta), que possibilitam
o emprego de sistemas que, de outra maneira, seriam inviáveis.
O mercado, entretanto, não parece refletir tal avanço
tecnológico. Os especialistas no assunto ainda se queixam de
que, na obra, o aspecto financeiro prevalece sobre o técnico.
Um desses críticos é Daniel Rozenbaum. Engenheiro civil
especializado em geotecnia, saiu da Consultrix, empresa especializada
em engenharia de fundações, para formar, com o engenheiro
Odair Boari Thomaz, a Fundacta. Há 14 anos no mercado, a empresa
tem no currículo obras como o edifício Birmann 29 e a
torre da TV Cultura, as duas em São Paulo. A Fundacta é
responsável também pelas fundações do Shopping
Light, no centro antigo de São Paulo. Rozenbaum considera o shopping
uma das obras mais complexas que já realizou, pelas dificuldades
de acesso de materiais e equipamentos. "Tivemos de adaptar a logística
da obra às exigências da CET (Companhia de Engenharia de
Tráfego)", conta. Em entrevista à Construção,
o engenheiro critica a inflexibilidade dessas normas. Ressalta, ainda,
os problemas causados pela falta de projeto de fundações
nas obras, o que, segundo ele, ainda é uma constante em empreendimentos
de menor porte.
Ë
possível traçar um perfil das obras na cidade de São
Paulo no que diz respeito às fundações?
As obras em que atuamos na cidade são, na maioria, de grande
porte e os empreendedores têm feito investimentos pesados. Os
edifícios comerciais não possuem mais um ou dois subsolos,
como antigamente. O padrão atual dita quatro ou cinco pavimentos
de garagem, sempre construídos no subsolo. Isso se deve à
grande concentração de veículos nas áreas
comerciais da cidade e à falta de vagas de estacionamento. A
profundidade das fundações nessas áreas tende a
aumentar, chegando ao ponto de ser necessário escavar a rocha.
Exemplo disso é a obra do BankBoston (construção
em andamento na marginal do rio Pinheiros, zona sul de São Paulo).
Com isso, a construção se torna mais arriscada e cresce
a demanda por tecnologias capazes de suprir tais exigências.
Qual
é o reflexo dessa mudança de perfil no momento de definir
um sistema de fundação?
O consultor de fundações não impões uma
solução. O que vem sendo feito é um minuncioso
estudo de custo e viabilidade técnica. Aí, sim, o consultor
e o construtor determinam a solução mais adequada para
o empreendimento.
Ainda
é constante a falta de projeto de fundações nas
obras?
Pelo menos no Estado de São Paulo, as obras de grande porte,
em geral, procuram uma consultoria. Os construtores de obras de menor
valor, entretanto, ainda não perceberam a importância de
um projeto bem elaborado. Ou então não têm infra-estrutura
financeira para arcar com esse gasto. O exemplo clássico dessa
situação é o do muro de arrimo. Ë típico
a construtora contratar um subempreiteiro que garante saber executar
o serviço e depois se ver obrigada a refazer o trabalho. Isso
sem contar os casos de empreiteiros sem qualquer preparo: ainda é
bastante comum os trabalhadores se acidentarem em obras de fundações
por pura irresponsabilidade da construtora.
Como
evitar esses problemas?
Em primeiro lugar, a cultura de apagar incêndios precisa acabar.
Quero dizer com isso que, muitas vezes, o problema chega ao consultor
com a obra já iniciada e cheia de erros. Nesses casos, uma consultoria
não é suficiente. Ë necessário que o projetista
esteja presente no canteiro, acompanhando a obra de perto. O comportamento
do solo não é previsível e isso pode gerar uma
tomada de decisão equivocada. O engenheiro residente não
tem - e nem se pode exigir que tenha - a mesma visão do profissional
de fundações.
O
senhor mencionou que a escolha do tipo de fundação depende
da relação custo-benefício proporcionada pelas
diversas soluções. Qual é, de fato, o peso do aspecto
econômico nesse processo?
O cliente, em geral, procura o que é mais barato. Nós
tentamos conscientizar o construtor a respeito da importância
da qualidade técnica e da segurança, em primeiro lugar.
O que é preciso é apontar uma boa relação
custo-benefício a longo prazo, como em qualquer outra negociação.
Há
alguma tendência no sentido de empregar fundações
cuja execução não seja agressiva ao meio ambiente?
Essa preocupação existe, mas ainda não foi incorporada
por muitas construtoras. A hélice contínua é a
grande vedete do momento, por oferecer rapidez de execução
e menor vibração. Nem sempre, entretanto, representa a
melhor solução, porque o desembolso é bastante
significativo e a mão-de-obra precisa ser especializada. Isso
impede o uso desse sistema em alguns empreendimentos de menor porte.
Nesses casos, alternativas menos modernas ainda podem ser boas soluções,
desde que seja considerada a interferência da obra na salubridade
do meio.
Quando
fala em salubridade do meio, o senhor também considera o nível
de ruído causado pelos equipamentos?
Essa questão é muito complicada. Se uma máquina
faz muito barulho, incomoda a vizinhança. Por outro lado, o CET
(Companhia de Engenharia de Tráfego) limita o trânsito
de caminhões, no centro da cidade, das sete horas da manhã
ao meio dia. Temos poucas horas para escavar, cravar e concretar estacas.
Além disso, essa determinação não diminui
o transtorno da vizinhança. Tudo fica mais difícil se
considerarmos que o caminhão pode se atrasar por conta do trânsito,
entre outros imprevistos. Em resumo, o construtor aluga a máquina
por oito horas e só trabalha metade desse período. O resultado
óbvio é o desperdício de recursos.
Como
as empresas de fundações estão se mobilizando para
resolver essas questões?
Penso que o principal seria adaptar o esquema de trabalho e os equipamentos,
buscando, com bom senso, uma solução coletiva. A Abef
(Associação Brasileira de Empresas de Engenharia de Fundações
e Geotecnia) está desenvolvendo um programa de qualidade que
visa melhorar o desempenho das empresas de sondagem, projeto e execução
de fundações no que diz respeito à qualidade dos
serviços prestados. Além disso, a Abef, em conjunto com
a ABMS (Associação Brasileira de Mecânica dos Solos
e Engenharia Geotécnica) e a Abeg (Associação Brasileira
das Empresas de Projeto e Consultoria em Engenharia Geotécnica),
pretende traçar as diretrizes de uma nova normalização
do segmento. A área de fundações passou por uma
grande mudança nos três últimos anos, marcados pela
entrada de diversas tecnologias no mercado. Essa processo requer regularização
e adaptação.
Quais
seriam essas inovações tecnológicas?
São sistemas para obras especiais, caso da utilização
de injeções que mudam as características do solo,
tornando viáveis algumas soluções antes impossíveis
de serem aplicadas.
Como
é possível modificar as características do solo?
Usamos um sistema chamado CCP (Cement Churning Pile) ou Coluna de Cimento
com Agitação Violenta, para elevar a rigidez do solo.
A base do sistema é uma haste metálica, com três
aberturas na ponta. Introduzimos a haste no solo e lançamos uma
calda de cimento em alta pressão. A haste gira e a calda se mistura
com a terra.
Quais
são as outras novidades?
Uma das mais interessantes é a substituição da
lama por polímeros na execução de barretes e estações.
Essa tecnologia, porém, não emplacou no Brasil como lá
fora. O nosso pessoal não se adaptou e ainda não há
disponibilidade de material importado. Existe ainda uma outra novidade,
bastante utilizada pelo nosso escritório, que é a contenção
com cortinas pré-moldadas.
Como
funciona?
Para obras com até dois subsolos, esse sistema permite executar
a cortina e o primeiro pavimento sem a retirada posterior de terra.
Primeiro, são cravados os perfis metálicos e, por trás
deles, são colocados grampos. Em seguida, são encaixadas
as placas pré-moldadas com uma armação leve de
concreto na parte posterior. Com a cortina pronta e a escavação
concluída, executamos o piso e não há mais terra
para ser retirada. O sistema convencional é muito complicado,
pois exige a entrada de equipamentos diversas vezes na obra, o que pode
desorganizar o canteiro. As cortinas pré-moldadas também
dispensam o prancheamento de madeira, evitando a praga do cupim. É
preciso, ainda, levar em conta o efeito psicológico, visto que
tudo fica pronto ao mesmo tempo.
Quais
são as tendências que o senhor apontaria para o futuro
do mercado de fundações?
Como todo o restante da construção, a etapa de fundações
caminha para o esquema de montagem, facilitando e tornando mais rápida
a conclusão dos trabalhos. Se já conseguimos implementar
um canteiro industrializado da estrutura em diante, está faltando
fazer o mesmo com as fundações·
Matéria
Publica na Revista A Construção São Paulo "Industria
Subterrânea"
Número 2729 - maio/00 - páginas 8 a 11
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